quarta-feira, 2 de junho de 2010

DIDEROT NÃO ESTÁ ON-LINE NESTE MOMENTO

Entre 1750 e 1772, trabalhei concentrado e quase solitariamente na elaboração de uma enciclopédia que abarcasse todo o conhecimento humano disponível na época. Como resultado, publiquei 28 volumes de ciência, arte e filosofia contra o obscurantismo. E com isso dei início a uma das profissões mais satirizadas da história humana: o vendedor de enciclopédia.

Muita gente se pergunta como consegui fazer uma Wikipédia inteira sem a colaboração da rede. Pois foi justamente a ausência de uma conexão de banda larga que me permitiu ser tão produtivo. Hoje eu nem teria passado do artigo sobre a letra A, que por sinal já é um artigo em si.

Virou um inferno trabalhar em um computador ligado à internet. Para um escritor, a rede é o paraíso das distrações. Porque você liga a máquina e não sai logo de cara trabalhando. Primeiro, você confere seus e-mails. Se, por acaso, a sua conta é do Gmail, alguém pode aparecer para um Gtalk. Depois, é inevitável ver o que está rolando no Facebook, se alguma fazendinha cresceu, se o voo para Orlando de alguém está no horário, quem são os aniversariantes do dia.

Já esquecido do que você foi fazer no computador, um aviso do Messenger pula na sua tela. Nada menos que três pessoas querem falar com você. “E ai?” “Tudo sussa?” “Boooooommm Diaaaaaa!” Você educadamente diz aos três que está ocupado e que retornará em outro horário. Mas para isso trocará uma infinidade de “beleza”, “então tá”, “bom trabalho”, “fui”.

Finalmente você está pronto para começar a produção. Nada disso. Como resistir a uma passadinha no Twitter para conferir as DMs, as menções, os trandtopics? Uma vez lá, você lerá algumas reclamações como “odeio gente imbecil”, navegará por alguns links sugeridos e saberá que alguma coisa importante aconteceu. O que fará com que você vá até um portal para entender melhor o corrido. Já bastante culpado e angustiado por não estar fazendo o que deveria, você retorna à página em branco. Mas o relógio no canto da tela e os seus olhos cansados informam que é hora de descansar, hoje não adianta mais insistir. Por isso te dou um conselho. Se você quer se concentrar nos seus objetivos, é melhor deixar de contar com a colaboração da rede e contar consigo.

5 comentários:

  1. PERFEITO!!! COMO SEMPRE, MEU AMIGO DIDEROT ATUALIÍSSIMO!

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  2. Grande verdade. As escolas deveriam pensar em incluir uma matéria nova em seus currículos - algo como "aprendendo a ter foco". Talvez, aprendendo desde pequenos, os futuros internautas não fossem tão dispersos quanto nós. Fim desta distração. :)

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  3. ah! é por isso que não te encontro mais no msn.

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  4. Elisabeto Ribeiro Gonçalves12 de junho de 2010 às 08:30

    Prezado jornalista VITOR KNIJNIK,

    Você atribui a Diderot (Blogs do Além, Carta Capital de 09/06/10) a autoria da frase o homem só será livre quando o último déspota for estrangulado com as entranhas do último padre. A verdade não é exatamente essa. A frase original é do único padre verdadeira e radicalmente ateu de que se tem notícia – Jean Meslier (1664-1729) cura de Etrépigny, na França. Filho de camponeses miseráveis, explorados e oprimidos pela nobreza e clero da época, Meslier foi obrigado a ordenar-se padre e servir num monastério da região. Generoso, reservava parte dos seus parcos ganhos para mitigar a fome e o sofrimento dos seus semelhantes. Nutria um ódio cesarino pela igreja, pelo papa e sua tropa de ladrões, mistificadores e opressores. Secretamente escreveu suas memórias (Mémoire contre la religion), um libelo visceralmente ateísta e contra tudo o que de mal representava o poder da nobreza e do clero. Ele foi, de justiça, um dos mais importantes precursores e antecipadores das grandes transformações revolucionárias que viriam a seguir. Em 1762, Voltaire publicou um Extrait des sentiments de Jean Meslier, logo batizado de Testament du curé Meslier. Infelizmente, Voltaire, um ferrenho anticlerical mas deísta, deu ao pensamento de Meslier um tom também deista, distorcendo-o e emasculando-o gravemente. A sentença original de Meslier, que envolvia o rei e o padre, foi recopiada e modificada ao sabor da época e dos autores, de modo que Diderot, o grande Diderot, fez exatamente isso. Mas, sem tirar o mérito de Diderot, é saudável e justo reconhecer a originalidade de Meslier. Atualmente eu reescreveria Jean Meslier contemplando especificamente as religiões: o homem só será livre quando o último papa morrer enforcado nas tripas do último aiatolá.

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  5. por falar em conectado, faz um blog do zygmunt bauman!!
    por favooooor

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